quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Depoimento do Pe. Enrico Galimberti

Pe. Enrico Galimberti
(Superior da Casa dos Combonianos de São José do Rio Preto, São Paulo.)
Pe. Enrico Galimberti registra os últimos momentos de Pe. Ângelo:

“Às 19,20 h de 7 de dezembro de 2000, depois do canto das vésperas da solenidade da Imaculada Conceição, Pe. Ângelo entrou em agonia. Mais uma vez lhe havia ministrado a unção dos enfermos e dado a absolvição geral. Às 20,20 h, morreu serenamente. Veio imediatamente à minha mente o salmo 122 que diz:
‘Que alegria quando me disseram: iremos à Casa do Senhor’. Pe. Ângelo tinha entrado para a Casa do Senhor com as mãos cheias e o coração repleto de tudo aquilo que havia doado na sua longa e fecunda existência de sacerdote, missionário, amigo dos pobres. E era muito.”
Pe. Enrico continua:
“Agora enquanto escrevo, são 0,20 h de 8 de dezembro, festa da Imaculada Conceição, da qual Pe. Ângelo era devotíssimo. Mas é também o 58.° aniversário de sua ordenação sacerdotal. Ele está agora no Santuário de São Judas Tadeu, com uma auréola branca, o terço entre as mãos, o Livro das Regras e o crucifixo da profissão religiosa no peito.
O povo já acorreu e ficará de vigília até as 15 h quando o Bispo diocesano celebrará a missa e, depois, às 16 h, se encaminhará ao Cemitério São João Batista para ser sepultado. [...]
Sua morte foi, pois, como a resposta de Maria às suas preces. Considerando sua vida e que, exatamente naquele dia, celebrava os 58 anos de sacerdócio, deve-se dizer que não poderia haver para ele um momento mais oportuno para entrar no reino dos céus, onde a grande festa em honra da Imaculada estava para começar.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Pe. Ângelo La Salandra – Uma Vida, Uma Missão. Balsas, 7/12/2001, p. 91

Depoimento de Dom Franco Masserdotti

Dom Franco Masserdotti (in memoriam)
(Bispo de Balsas, dentre outros cargos, exerceu o de presidente do CIMI – Conselho Indigenista Missionário e responsável pela Missão Ad-Gentes do Conselho Episcopal Latino-Americano – CELAM. Fundador da “Associação dos Amigos de Pe. Ângelo”. Foi nosso maior incentivador. Faleceu em Balsas, sul do Maranhão, em 17 de setembro de 2006, vítima de atropelamento.)
 “O caminho missionário de Pe. Ângelo e a herança espiritual que ele nos deixou sem dúvida se inspiraram nos exemplos do Bem Aventurado Daniel Comboni, fundador dos Missionários Combonianos de quem Pe. Ângelo foi filho devoto e obediente.
Uma característica marcante na vida de Daniel Comboni foi a profunda e íntima comunhão que ele tinha com Cristo, Bom Pastor, que morreu na cruz de braços abertos, para dar a vida e unir todos os povos no grande abraço do Pai. Foi esta fé, esta união com Deus que lhe dava força e esperança nas dificuldades da missão.
Pe. Ângelo foi digno discípulo de seu fundador. Era um homem de oração, vivia constantemente unido a Deus e a Maria, a “Mãezinha Querida”. Para ele, Cristo era o centro e o protagonista da missão que levava à frente. Aí ele encontrava força e coragem.
Pe. Ângelo sempre se sentia feliz e empolgado, rezando pelas pessoas que era chamado a servir. Era um intercessor junto a Deus em favor de seu povo.
O exemplo dele nos recorda que a oração é o respiro da alma do cristão e que  todos devemos colocar o Senhor como centro e protagonista de nossa vida e de nosso compromisso cristão.
Daniel Comboni tinha feito uma opção clara e decidida pelos pobres e abandonados que ele identificou nos povos da África dizimados pela fome, pelas doenças, pelas injustiças e opressões do colonialismo e da escravidão, esquecidos pela solidariedade internacional e sem a esperança que brota do encontro com a pessoa de Jesus.
Também Pe. Ângelo fez uma opção radical pelos pobres. Acolhia-os com amor e respeito. Visitava constantemente os doentes e os presos, e preocupava-se com os meninos de rua.
Sonhava poder trabalhar com os indígenas. Vivia com um jeito simples e humilde, sendo solidário com os pobres.
Ao mesmo tempo, convencido de que não bastava ‘dar o peixe’, mas é necessário ensinar a pescar’, se empenhou muito no campo da educação, dando atenção particular à formação dos futuros Presbíteros e dos futuros líderes da Sociedade.
Sem dúvida sua obra prima foi o Colégio São Pio X, que ele fundou e ao qual deu o melhor de si. Sua opção reinterpretada hoje na nossa realidade, nos estimula e nos compromete em favor da vida, nas situações em que ela é mais ameaçada, em que projetos econômicos e sociais baseados no egoísmo e na competição levam ao prevalecer do mais forte sobre o mais fraco, levam ao materialismo prático, ao desequilíbrio ecológico, à violência e à corrupção.
Pe. Ângelo nos ensina que a fidelidade a Cristo e ao Evangelho exige um estilo de vida buscado na simplicidade, na partilha com os pobres, na solidariedade, nas relações humanas e sociais e no compromisso político.
Há um outro aspecto em que Pe. Ângelo se revela discípulo de Daniel Comboni: a paixão pelo Reino e a generosidade no serviço missionário. Comboni dizia preferir morrer a renunciar a ser missionário na África. Pe. Ângelo até os últimos dias de sua vida, parecia sentir, no profundo de seu coração, o suspiro de São Paulo: ‘Ai de mim se eu não anunciar o Evangelho’ (1Co 9,16).
Com seu entusiasmo, com sua dedicação total, ele nos ensina que a vida não é uma propriedade particular de que possamos gozar egoisticamente. É, antes, um dom para os outros. Melhor ainda, é um ‘lava-pés’ (cf Jo 13, 4-15).
Ele nos recorda, com seu exemplo, que o batismo que temos recebido não é um privilégio, nem um passaporte para o Paraíso; mas é um compromisso para sermos generosos missionários e missionárias do amor que brota de Deus e que deve invadir e transformar o mundo.
Há um lindo poema do bispo dos pobres, Dom Hélder Câmara, que aqui desejo recordar:
Missão é partir, caminhar, deixar tudo, sair de si, quebrar a crosta do egoísmo que nos fecha no nosso Eu.
É parar de dar volta ao redor de nós mesmos como se fôssemos o centro do mundo e da vida.
É não se deixar bloquear nos problemas do pequeno mundo a que pertencemos:
A humanidade é maior.
Missão é sempre partir, mas não devorar quilômetros.
É sobretudo abrir-se aos outros como irmãos, descobri-los e encontrá-los.
E, se para descobri-los e amá-los, é preciso atravessar os mares e voar lá nos céus, então missão é partir até os confins do mundo.
Este poema se aplica muito bem a Pe. Ângelo. Ele agora vive feliz no coração de Deus. Ele interceda por nós, para que rezemos como ele, bons samaritanos do amor e promotores da vida e da esperança neste mundo movido pelo egoísmo, pelo medo e pela morte.
Balsas, Festa de Todos os Santos, 2001. Dom Franco, Bispo diocesano de Balsas
In Apresentação do livro: Pe. Ângelo La Salandra -- Uma Vida, Uma Missão, de Maria do Socorro Coelho Cabral, pp. 7-9.

Depoimento de Maria do Socorro Coelho Cabral

Maria do Socorro Coelho Cabral (in memoriam)
(Autora do livro Pe. Ângelo La Salandra - Uma Vida, Uma Missão. Mestrado em História pela PUC-SP e doutorado pela Universidade de São Paulo. Publicou, dentre outras obras, Caminhos do gado -- obra de referência sobre a colonização do sul do Maranhão. Fundou com Dom Franco a “Associação dos Amigos de Pe. Ângelo”, com dois objetivos principais: dar continuidade à história de Pe. Ângelo e ajudar estudantes carentes a continuar seus estudos.)
“Com certa freqüência Pe. Ângelo me escrevia, como escrevia a todos os seus amigos e ex-alunos de Balsas e dos lugares por onde passou na sua tarefa missionária.
Mas, em 22 de novembro de 2000, ele me escrevia para me comunicar que estava me enviando cópia de seu diário para que dele eu fizesse uso oportuno.
Minha emoção só não foi maior que minha responsabilidade diante de tão nobre e difícil desafio.
Eu teria que tirar do precioso livro de sua vida tudo que pudesse servir
“para animar o povo cristão do espírito missionário e suscitar alguma vocação missionária entre os jovens”.
O ardor missionário, desejando ver proclamado o evangelho da salvação aos povos do mundo inteiro, acompanhava-o durante toda sua vida.
Quinze dias após, no dia 7 de dezembro de 2000, na vigília da festa da Imaculada Conceição, morria o ardoroso missionário comboniano, Pe. Ângelo La Salandra. Era essa data especial para ele, tanto pelo seu amor filial a Maria, como por ser o dia de aniversário de sua ordenação sacerdotal.
No já longínquo 8 de dezembro de 1942, na distante cidade de Tróia -- Foggia, Itália, no Santuário de Nossa Senhora Medianeira, o jovem Ângelo, aos 23 anos, em meio a alegrias e júbilos, era consagrado sacerdote diocesano.
Esse dia 8 de dezembro de 2000, foi festejado, com certeza, de forma diferente dos anteriores, em meio às alegrias celestiais, recebendo, como servo humilde do Senhor, o justo salário, o triunfo da vitória.
Foram 58 anos de vida de renúncia, orações, contemplações, sofrimentos, alegrias, sacrifícios, trabalho, muito trabalho na messe do Senhor.
Espírito forte, combativo, entusiasta, Pe. Ângelo possuiu, durante seus 81 anos de vida, um coração que “ardia do fogo de amor que nutria por Deus e pelos irmãos”.
Como missionário, seu desejo foi sempre fazer a vontade do Senhor, intento esse várias vezes expresso na frase que tanto o identificava: “vontade do Senhor, paraíso meu”.
Em função disso, procurou aceitar tudo aquilo que o Senhor permitia que lhe sobreviesse, mesmo quando, muitas vezes, o que lhe era apresentado custasse-lhe sacrifícios enormes e difíceis.
Pretendemos aqui tão-somente narrar alguns fatos que consideramos significativos da vida de Pe. Ângelo.”
Entender historicamente, analisar, compreender, de forma ampla e profunda, à luz das múltiplas determinações históricas, vida rica e complexa como a de Pe. Ângelo, não foi nosso propósito, até mesmo por razões de limitação de tempo.
Este trabalho, pois, traz um relato simples, cronológico, de alguns fatos que mostram, de alguma forma, traços da personalidade, aspectos da atuação desse grande educador.
Nele também procuramos mostrar, de uma maneira sucinta e bem geral, a inserção, no contexto sócio-cultural sul-maranhense, da ação missionária de Pe. Ângelo e dos Combonianos na região, no período de 1960 a 1975.
A missão de Pe. Ângelo foi marcada profundamente pela sua concepção de mundo. Essa sua visão da vida e das coisas foi permeada por elementos vários, às vezes até contraditórios, ligados a épocas históricas diferentes e a momentos singulares e marcantes da vida da Igreja, como foram os dos Concílios de Trento e Vaticano II. Além desses elementos externos, havia também fatores individuais, familiares, forjando a vida e a trajetória missionária de Pe. Ângelo, fazendo dele esse homem singular, criativo, contemplativo, realizador.
Através dos vários fatos narrados, podemos observar um sacerdote que acolheu, que se preocupou e se doou, procurando levar a Jesus os “filhinhos”, sobretudo os mais pobres e esquecidos: encarcerados, mendigos, migrantes nordestinos pobres, doentes abandonados, favelados e outros. Procurou ajudar, além desses, a tantos outros jovens e adultos, a quem orientou, educou e formou.
Ao mesmo tempo em que se mostrava rígido, era humilde, amigo, generoso, amoroso.
Achamos que o segredo para o fato de Pe. Ângelo ter atraído tantas pessoas a ele, marcando-lhes positivamente a formação e o caráter, foi sua vida íntegra, transparente, simples, despojada, plena da graça divina, da fé, do amor. Pensamos que o grande segredo mesmo foi o amor, essa força que o contagiou e irradiava a todos que dele se aproximavam, levando-os a sentirem-se amados e a crescerem moral e espiritualmente.
Por isso creio que as limitações, as falhas que, com certeza, fizeram parte de sua vida foram superadas por esse sentimento que, predominando, tudo transformou, fazendo aparecer e florescer as qualidades, as virtudes que marcaram sua vida e a de tantos outros por ele influenciados.
Madre Tereza de Calcutá nos ensina: “Cristo não nos perguntará quantas coisas fizemos, e sim o quanto de amor colocamos em nossas ações.”
Pe. Ângelo, como Santa Teresinha, doutora da Igreja, descobriu que a vocação maior do cristão é amar e procurou pautar toda a sua vida por esse prisma. Em função disso, tornou-se um sinal de presença viva e modeladora de Deus entre nós.
Narrar alguns fatos de vida tão fecunda e profundamente mergulhada no mistério de Cristo morto e ressuscitado é tarefa sedutora e edificante.
Os acontecimentos descritos, a nível da superfície, foram colhidos em seu Diário, nas cartas-circulares que escreveu aos amigos e ex-alunos, na obra biográfica de Lourenço Gaiga sobre Pe. Ângelo e ainda no grande número de testemunhos que nos chegaram de pessoas que o conheceram, ou que com ele conviveram.
Pedimos a luz do Alto, para que sejamos fiéis aos projetos de Deus e aos propósitos mencionados por Pe. Ângelo, ao nos confiar cópia de seu Diário.”

In Introdução do livro Pe. Ângelo La Salandra -- Uma Vida, Uma Missão. Balsas, 7-12-2001pp.11-13.

Depoimento do Pe. João Audísio

Pe. João Audísio
(Professor no Colégio S. Pio X, escreveu a Pe. Ângelo sobre a transferência deste para Messina, na Itália.)
“Ficamos todos tristes pela notícia que nos foi dada. Todos nós contávamos com sua presença, fundador e animador do Colégio Pio X, onde ninguém tem a coragem de assumir a responsabilidade da direção. Você é muito estimado por todos, e por isso, uma tomada de posição sua vale mais do que qualquer outra.
Graças ao bem que está fazendo o Colégio na formação dos leigos, sempre encontrou grandes dificuldades e inimigos ferrenhos: anticlericalismo maçônico, espiritismo e protestantismo.
Somente você conseguia fazer frente a todos.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, p.. 54.

Depoimento do Irmão Domingos Barbieri

Irmão Domingos Barbieri (Confrade comboniano em São José do Rio Preto, São Paulo.)
“Nos últimos tempos, em São José do Rio Preto, intensificou seu ministério, dando-lhe um ritmo ainda mais cansativo. Voltava altas horas da noite, comia  o que sobrava e aqui, com o calor que faz, a comida estraga com facilidade. Ele engolia rapidamente sem esquentar. Todos reparavam que, naquele modo de vida, não poderia durar muito. Não se podia falar-lhe, porque tinha sempre razão. Puxava continuamente os pobres no assunto, dizendo que, se tivessem aquela comida, se diriam afortunados. E dizia mais: que era necessário sofrer, porque as almas se pagam como Cristo pagou na Cruz. O que poderiam dizer os confrades, defrontando-se com essas razões?”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, pp. 87-88.

Depoimento do Sr. Márcio da Cunha

Sr. Márcio da Cunha
(Morador em São José do Rio Preto.)
“Tive a grande dádiva de Deus de conviver algum tempo, curto, infelizmente, com o santinho Ângelo La Salandra. Figura carismática, celebrando a Santa Missa, incentivando e rezando o terço e em suas atitudes de homem de Deus. Transfigurava o próprio Cristo. É um intercessor que temos junto a Deus. Não nos esqueçamos de invocá-lo, para recebermos as graças de Deus.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, p. 88.

Depoimento de Dom Franco Masserdotti

Dom Franco Masserdotti
(Trecho de carta enviada por Dom Franco ao irmão de Pe. Ângelo,
Monsenhor Nicola.)
“Desejo apresentar ao senhor e a todos os familiares, em meu nome e de toda a Diocese de Balsas, os fraternais pêsames acompanhados por nossa oração pelo Pe. Ângelo e por vocês todos.
Todos nós e nosso povo ficamos muito tristes pela notícia da morte de Pe. Ângelo que foi para Balsas e para toda a região uma presença muito significativa, seja do ponto de vista eclesial, seja do ponto de vista do progresso social e sobretudo no campo da educação. Pe. Ângelo entrou na história de nossa região em modo permanente e vital, pela fé,pelo espírito de doação e generosidade. Por isso é considerado por todos como um santo e um pai de fé. Temos a certeza de que Pe. Ângelo já vive na casa do Pai celestial. E agora continua a interceder por todos nós, sobretudo pelos pobres que ele tanto amou. Será nosso empenho assumir sua herança para servir sempre e melhor nosso povo.”
In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op. cit, p. 93.
Dom Franco escreveu também:
“Pe. Ângelo entrou na história da nossa Diocese e região em modo permanente e vital, pela sua fé e espírito de doação, sendo assim considerado por todos como um santo”.

In “santinho-recordação” Pe. Ângelo La Salandra, 7/12/2001.

Depoimento do Pe. Narduolo

Pe. Narduolo
(Pe. Narduolo, confrade de Pe. Ângelo.)
Pe. Narduolo nos relata como era a rotina de Pe. Ângelo:
“De noite, depois das 8, saía em busca dos mendigos nas calçadas ou dos vigias dos condomínios sempre falando de religião, ou fazendo catecismo, ou preparando adultos ao batismo e à Primeira Comunhão. Caminhava, tendo sempre na mão direita o terço e, na esquerda, um saquinho de plástico com
biscoitos, vestidos e livrinhos de orações para distribuir.”
Como era a sua vida de oração:
“Sua jornada começava de manhã muito cedo. Ia à capela, ajoelhava-se, beijava o chão e ficava um pouco de joelhos com os braços abertos perante o Tabernáculo. Depois levantava-se e rezava as orações da manhã, aquelas que se encontram no livro da Congregação, como lhe haviam ensinado no noviciado. Rezava o breviário das leituras, em seguida rezava com a comunidade o ofício das Laudas e aí começava a missa, vestindo sempre a alva e a estola. Preferia ficar junto ao altar. Ao sair, ia à capela para conversar com o Senhor. Ao chegar, a primeira coisa que fazia era subir ao segundo andar, onde está a capela e ficava ali em oração. Ao meio-dia, se encontrava na Capela, fazendo o exame de consciência e rezando o Angelus. De noite, quando retornava lá pelas 22 ou 23 horas, entrava na capela, rezava as orações da noite, em seguida as Completas.”
Pe. Narduolo continua a nos falar sobre Pe. Ângelo:
“Sei que pedia a Nossa Senhora a graça de não incomodar demais os outros no momento da morte. E bastaram somente três dias para passar da terra para o céu. Sinal de que Nossa Senhora ouviu suas preces e o atendeu também em muitas outras coisas.
Agora estou contente por havê-lo encorajado e apoiado em suas iniciativas. Peço a ele que me ajude na humildade,  na dedicação ao meu trabalho apostólico, na ajuda aos pobres e doentes e no respeito aos confrades. Todas as lições que ele me deu com sua vida, com seu exemplo silencioso e sorridente.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op. cit, pp. 73, 86 e 88.

Depoimento de Pe. Afonso Cigarini

Pe. Afonso Cigarini 
(Pe. Afonso Cigarini esteve com Pe. Ângelo certo tempo na Paróquia de Paço de Arcos, Portugal.)
“Dizer que a vida naquela miserável casa paroquial era pobre é não dizer nada. Não havia água, não havia luz, não havia fogo. Abundavam os parasitas que saíam da madeira desconexado assoalho: pulgas, percevejos, baratas... não conseguíamos livrar-nos de jeito nenhum, porque parecia que debaixo do assoalho havia a fábrica.
Pe. Ângelo não se queixava. Ao contrário, dizia que aquelas criaturas davam-nos a possibilidade de oferecer algo ao Senhor pelas almas da Paróquia.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, p.. 27.

Depoimento de Pe. Alfredo Neres

Pe. Alfredo Neres
(Missionário comboniano, conheceu Pe. Ângelo em Paço de Arcos, Portugal. Trabalha há mais de 20 anos como missionário no Congo, África. Enviou-nos este testemunho em setembro/2008.)
“Estava a viver há seis meses em Paço de Arcos, quando a primeira comunidade dos Missionários Combonianos aí chegou. O Pe. Ângelo era o superior da comunidade e responsável da Pastoral da capelania de Paço de Arcos, que nessa altura ainda não era paróquia, mas dependia da paróquia de Oeiras. O Pe. Ângelo tinha então 36 anos. Mas a sua longa barba, a sua postura, os óculos enfiados na cara davam-lhe uma aparência de 50 anos.
Pe. Lassalandra passava longas horas em oração no coro da capela do Senhor Jesus dos Navegantes, com os olhos fixos no sacrário. A atenção e a intensidade da sua oração deixavam-me perplexo. Era a primeira vez que me encontrava com um homem de oração desse calibre. Às vezes ia ter com ele ao coro da capela para me confessar ou perguntar qualquer coisa, mas via-o tão imerso na oração que não tinha coragem de o interromper. Ficava longamente à espera que ele levantasse os olhos e me fixasse, mas isso não acontecia. Por fim, ganhava coragem e ia-o interromper. Mas se ele estava a rezar o breviário e lhe faltava rezar uma parte da hora litúrgica que estava a rezar, fazia-me sinal com a mão, sem dizer palavra, para que esperasse. Depois vinha-me confessar ou responder àquilo que lhe perguntasse. Parecia que ele vinha de outro mundo! Tal era a intensidade da oração.
Gostava muito de me confessar ao Pe. Ângelo. Ele tinha sempre uma palavra a propósito de encorajamento para me dizer. Foi o segundo director espiritual que tive na minha vida. Tinha 16 anos quando o escolhi como director espiritual e com ele caminhei até ir para o seminário, depois de ter feito os vinte anos. Aqueles cinco anos, que o tive como director espiritual, foram-me muito úteis. Nesse tempo, ele disse-me para arranjar mais 4 jovens para começar com eles uma secção da JOC (Juventude Operária Católica). Convidei o Joaquim, o Raul, o José Luís e o Luciano. Assim, começámos os cinco a primeira secção da JOC em Paço de Arcos. Pouco a pouco, com a sua ajuda, tornámo-nos os cinco primeiros militantes. Foi ele que nos iniciou ao encontro assíduo com a Palavra de Deus, à comunhão diária (mesmo quando não podíamos participar na celebração da Santa Missa), à confissão frequente, ao menos mensal, à direcção espiritual e à oração diária do Terço. Ele comprava para a secção todos os livros que conhecia sobre a JOC, para que nós entrássemos em profundidade no espírito daquele movimento de jovens. De facto, em pouco tempo o número dos jocistas aumentou consideravelmente. Ele apoiava-nos sempre nas iniciativas que poderiam ajudar os jovens a aproximar-se de Cristo.
O P. Ângelo era uma pessoa sempre disponível para atender toda a gente, com uma atenção especial para com os pobres. Ele procurava interessar as pessoas mais ricas da paróquia para que ajudassem os pobres a terem uma casa digna e o necessário para viver.
Procurou meios para arranjar a capela do Senhor Jesus dos navegantes, para ser  mais funcional. Também procurou arranjar os locais do rés-do-chão da residência da comunidade para que aí houvesse salas para a catequese e um pequeno salão para as reuniões dos grupos ou do conselho da capelania.
O P. Ângelo deu-se de alma e coração para organizar a catequese para as crianças. Escolheu um grupo de catequistas, homens e mulheres, e confiou-lhes os manuais da catequese segundo a idade e capacidade das crianças. Fui um desses catequistas. Era a primeira vez que muitos de nós dávamos catequese. Por isso, o primeiro ano, ele reunia os catequistas segundo o volume que eles tinham de utilizar e dava-nos ele a catequese, como nós a devíamos dar às crianças. Assim, ele foi o nosso catequista e nós éramos os catequistas das crianças. Com esta metodologia missionária, sem que nós déssemos conta, estávamos a ser bem catequizados, o que foi muito útil para todos.
Quando não havia dinheiro na caixa para as obras, o Pe. Ângelo ia ter com uma e outra pessoa, apresentando-lhe a situação e as necessidades da Igreja. Ninguém tinha a coragem de lhe dizer ‘não’ quando ele pedia qualquer coisa. Pois, dado o seu estilo de vida paupérrima, toda a gente sabia que ele não retinha nada para ele, ou para a comunidade, mas tudo aquilo que era dado para una finalidade era empregado com esse fim, sem desvios possíveis.
O Pe. Ângelo gostava de nos pôr à prova para ver até que ponto éramos capazes de renunciar àquilo de que gostávamos muito em vista dum fim mais nobre. Dou um exemplo: Quando três de nós pedimos para ir para o Seminário, ele impôs-nos de renunciar à praia durante todo o verão. Ele bem sabia que nós gostávamos muito da praia e éramos bons nadadores. Quando lhe dizíamos que podíamos ir para uma praia mais recatada, pouco frequentada, ou mesmo ir tomar banho ao mar, onde não havia praia, a resposta dele era muito simples: ‘O Pe. Ângelo vai à praia?’ Com esta resposta deixava-nos completamente
desarmados. Não havia maneira de replicar. Mas esse sacrifício ajudou-nos pela vida fora, para sabermos renunciar a tantas coisas que não eram em conformidade com a nossa vocação missionária.
Durante os anos que o Pe. Ângelo ficou em Paço de Arcos, a vida cristã daquela terra cresceu visivelmente. O número dos habitantes de Paço de Arcos aumentou muito, durante os anos que o Pe. Ângelo lá esteve o número das missas dominicais passou de uma a cinco, cada vez mais frequentadas. A capelania desenvolveu-se muito e começou-se logo a pensar em fundar uma paróquia destacada de Oeiras. Para isso era preciso construir uma verdadeira Igreja Paroquial. Nesse sentido, o Pe. Ângelo deu-se de alma e coração para que fosse urbanizada a quinta, que existia no actual lugar da Igreja. Mas ele impôs a condição que o terreno para a Igreja fosse reservado no centro da urbanização e fosse dado gratuitamente à Igreja, o que ele conseguiu. Mas não teve a alegria de ver a Igreja construída. Seria a seu sucessor Pe. Luís Nesi a levar a cabo essa empresa.
Em suma, os anos, que vivi com o Pe. Ângelo, foram uma graça muito grande para mim. Todos o considerávamos como um santo. Ele edificava toda a gente que o contactava. A sua presença em Paço de Arcos foi um grande dom de Deus para aquela terra.”

Pe. Alfredo Neres

Alfredo Neres
Missionnaires Comboniens
Avenue Chrétienne, 13 - Kintambo
B.P.724
KINSHASA - LIMETE
(République Démocratique du Congo)

Depoimento de Pe. Gesuíno Podda

Pe. Gesuíno Podda
(Exerceu o cargo de Provincial dos Combonianos do Brasil-Norte.)
Pe. Gesuíno nos apresenta alguns traços da personalidade de Pe. Ângelo nos anos sessenta:
 “Pe. Ângelo é, sem dúvida, uma figura extraordinária e profética que deixou sua marca na cidade de Balsas que o tempo não apagará. Mas, como em todas as realidades humanas, além dos méritos, há também os pontos sombrios. O Santo também é uma fotografia em preto e branco. A santidade não é impecabilidade, não é um dom gratuito de Deus, mas uma conquista que exige uma guerra sem trégua contra o que se opõe ao projeto de Deus. Santo é aquele que caminha, mesmo claudicando com os pés inchados e ensangüentados, seguindo a Jesus. É o caso de Pe. La Salandra.
Conheci-o de perto, quando foi meu superior provincial nos anos sessenta. Naquele tempo, o Provincial não era eleito pela base, mas nomeado diretamente pelo superior geral.
Pe. Ângelo tinha parado no tempo. Inspirava-se no Concílio de Trento. Identificava a vontade do superior com aquela de Deus, assumindo, às vezes, atitudes duras, não sempre justas.
Como Provincial, não pôde fazer melhor, porque era completamente tomado pelo Seminário e pelo Colégio.
Todavia soube criar uma síntese muito significativa, descobriu pólos nucleares da vida cristã: Deus e o Homem. Ângelo era um contemplativo; passava muito tempo em oração até tarde da noite, especialmente quando a situação do Colégio S. Pio X se tornava problemática.
Muitas vezes devia viajar até São Luís para tratar de problemas da escola com a Secretaria da Educação do Estado e não raras eram as vezes em que esperava horas, longas horas para falar com o secretário, sempre com a  arma em punho: o terço.
Formou jovens para a vida sacerdotal, alguns dos quais chegaram à meta e trabalham na Diocese de Balsas e alguém até em São Luís.”
Pe. Gesuíno fala mais uma vez dele:
“A Diocese de Balsas havia servido, como suplente, àquela enorme região com importantes obras sociais: Hospital São José, Colégio S. Pio X, Escola Normal etc. No início dos anos oitenta, a Igreja empobreceu, entregando o Hospital aos camilianos, o Colégio [S. Pio X] aos Maristas e a Escola Normal ao Estado. Assim perdia a aparência de Igreja rica e poderosa. Mas empobreceu mais ainda com a partida de Pe. Ângelo que, de noite, no silêncio, acompanhado pelo Irmão Soares, ia trabalhar em outras terras e sob outros céus. Todavia ficou sempre em contato com seus ex-alunos (que não são poucos) através de cartas-circulares cheias de fé e entusiasmo juvenil.
Animado sempre pela esperança e otimismo, não envelheceu e conservou sua identidade de homem de Deus e dos pobres até o túmulo.”
In Maria do Socorro Coelho Cabral. Pe. Ângelo La Salandra – Uma Vida, Uma Missão. Balsas, 7/12/2001, pp. 53 e 55.

Depoimento de Dom Rino Carlesi

Dom Rino Carlesi 
(Trecho de carta de Dom Rino Carlesi (Bispo de Balsas) a Pe. Ângelo, quando este iria ser transferido de Balsas para Messina, na Itália.)
“Seu destino em Messina foi para todos nós um trovão em céu sereno. Sua presença em Balsas é indispensável para o início do ano escolar, tanto mais que o secretário de Educação do Estado quer transformar nossa escola em escola estatal, mas deixando para nós a administração e a direção. Isto resolveria a questão econômica que, como sabe, nos angustia. Nenhum dos padres aqui quer o cargo de diretor do colégio. Mas olhe em quais apuros nos colocou o seu deslocamento para Messina. Já escrevi nesse sentido aos superiores de Roma e aguardo uma resposta urgente.

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, p. 54.

Depoimento de Dom Orani Tempesta

Dom Orani Tempesta
(No dia do sepultamento de Pe. Ângelo, 8/12/2000, Dom Orani, Bispo de São José do Rio Preto, presidiu a celebração da missa e teceu o elogio fúnebre.)
“Na Província e na Congregação, Pe. Ângelo deixa recordações muito vivas de sua singular personalidade: zelo apostólico, dedicação incansável à missão, espiritualidade quase monástica, atenção pelos pobres, pobreza e simplicidade de vida, além de uma existência quase exagerada de estar sempre a serviço dos outros, dia e noite.
Devemos concluir que o Pe. Ângelo foi um dom de Deus para a congregação comboniana e para a Igreja, um homem inteiro, sem eivas, missionário convicto até os ossos, chegando ao serviço de Deus e dos homens, percorrendo um caminho cheio de cruzes físicas e morais, mas também de alegrias apostólicas íntimas.
Seu entusiasmo contagiou gerações de combonianos e fez tanto bem aos fiéis entre os quais passou. Os motores que impulsionaram sua atividade foram as duas grandes devoções aos SS. Corações de Jesus e Maria. Seu exemplo é certamente um estímulo e incentivo para todos.”
In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, pp. 91 e 92.
Dom Orani escreveu também:
“Padre Ângelo possuía o espírito Missionário como uma  segunda natureza, e, até o final da vida, a ânsia de anunciar a Boa Nova, o levou a ir aos doentes, presos, pobres e estar disponível a serviço da Igreja, onde e como quer que necessitasse.
Feliz família de Comboni que pode entregar um fruto assim maduro nos braços do Pai!
A Diocese de Rio Preto agradece a Deus por ter testemunhado os seus últimos anos de vida entre nós e poder guardar, qual semente preciosa lançada à terra, os seus restos mortais, na confiança de brotar para toda a Diocese o espírito missionário que contagie a todos no alvorecer do novo milênio cristão!”

In  “santinho-recordação” Pe. Ângelo La Salandra, 7/12/2000.

Depoimento do Padre Pedro Fontes

Padre Pedro Fontes
(Foi seminarista de Pe. Ângelo. Em 2001, quando deu este testemunho, era o vigário geral da Diocese de Balsas.)
“Conheci Pe. Ângelo em 1966, quando jovem tímido, vindo do interior de Balsas, com vontade de ser padre, fui recebido por esse homem de barba grande e olhos profundos.
Ele acolheu-me no Seminário São Pio X, falava difícil, mas, desde o início, demonstrou muita alegria e simpatia por mim, dando-me esperança de que eu pudesse entrar no Seminário no ano seguinte.
Logo após esse primeiro contato, ele arrumou para mim uma professora particular (Prof.a Consolação Cardoso), para que eu me preparasse melhor para o exame de admissão ao curso ginasial. E o resultado foi positivo.
Na convivência do dia a dia, muitas coisas do caráter eu não compreendia devido eu ser sertanejo de pouquíssima cultura e visão de outra cultura. Ficava mesmo sem entender o jeito de falar dele, mas, mesmo assim, fui andando com ele, aprendendo com ele.
No Seminário, eu admirava muito como ele nos tratava: com igualdade, paciência e muita compreensão de pessoa amiga.
Conviver com Pe. Ângelo foi uma experiência muito marcante e significativa para mim. Ele me ensinou a amar o próximo e a ser coerente na vida.
Por tudo o que ele me transmitiu para a vida é que eu lhe dedico todo o meu apreço e o meu carinho.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, p43.

Depoimento do Professor João Tavares

Professor João Tavares
(Ex-aluno de Pe. Ângelo no Seminário de Viseu, Portugal. Enviou-nos o seu testemunho em agosto/2008.)

1. Conheci o Pe. Ângelo em Viseu. Ele foi meu primeiro Diretor Espiritual. Além disso ele era ecónomo do Seminário, isto é, tinha a seu cargo não deixar faltar comida para mais de cem seminaristas na voracidade da adolescência e também tinha de arranjar madeira, telha, tijolo, pedra e cimento para levar a cabo a construção do Seminário das Missões. Mais ainda ele assumiu também, com Pe. Carlesi, futuro Bispo de Balsas, o recrutamento vocacional, indo na velha e única moto Guzzi, pelas paróquias incentivar a vocação missionária, nas escolas e nas igrejas. Foi assim que eu, sabendo que um meu primo ia para o Seminário das Missões, chamado pelo Pe. Ângelo que o recrutou na Escola de Carvalhais, de onde eu já tinha saído havia um ano, me apresentei ao Reitor do Seminário (mediante carta de meu pai), me oferecendo para fazer o período probatório, em Agosto de 1952.
2. Pe. Ângelo, além de muito piedoso e grande devoto de Maria, sempre foi um padre muito entusiasmado... diria até agitado, para não dizer vulcânico.
3. Foi amigo de Salazar o que, no fim da ditadura, foi muito importante para os combonianos em Portugal, quando eles, por suas atitudes claras e firmes, em Portugal e Moçambique, veio a ser de muita utilidade. Quando Paulo VI foi à Índia, a revista missionária comboniana ALÉM-MAR fez um bom trabalho jornalístico e os combonianos foram perseguidos por isso, pois Portugal estava de relações cortadas com a Índia devido à anexação de Goa, Damão e Diu pelo Pandita Nheru, na década de 50.
4. O Pe. Ângelo veio para Balsas por volta de 1960, onde ficou até por volta de 1978. Foi Superior Provincial dos Combonianos e renomado Diretor, por longos anos, do Seminário e do Colégio Pio X, um dos melhores do Maranhão, senão o melhor. Ali se formaram gerações de estudantes hoje espalhadas pelo Brasil inteiro e que, tenho a certeza, guardam dentro de si, um grande carinho e admiração pelo seu grande Educador. Sei que também era respeitadíssimo pelos órgãos governamentais em S. Luís, onde, com seu jeito forte e cativante, conseguia o muito que precisava para o Colégio Pio X. O Governador João Castelo, nas duas vezes que conversámos, falou-me muito bem do Pe. Ângelo como educador e acrescentava, rindo, que mandou muito dinheiro para o Colégio Pio X. Com o Pe. Ângelo, ninguém podia: era um excelente argumentador e era difícil lhe resistir. Porque, sobretudo, além de Lógica, tinha trabalho e qualidade para mostrar... Certa vez vi as apostilas de Filosofia que ele dava para os alunos e fiquei impressionado pela qualidade e profundidade do conteúdo.
5. Eu cheguei a Balsas em 1967, quando o Pe. Ângelo acumulava as funções de Superior Provincial dos Combonianos, Reitor do Seminário e Diretor do Colégio S. Pio X. Ele, sem me consultar, já tinha destinado para mim: ficar com ele no Seminário como Vice-Reitor e ser professor de Português, Grego e Francês. Declinei da honrosa proposta e pedi para, antes de ser formador de seminaristas em Balsas, ir conhecer o Povo Brasileiro, na pastoral direta nas imensas paróquias do sertão sul-maranhense. Com um argumento muito simples: como poderia eu, acabado de me formar e de chegar da Europa, ser formador de padres para o Brasil, sem conhecer nada do Brasil? 
6. Eu era recém-ordenado e tinha passado 15 anos no seminário e estava mesmo precisando por as mãos na massa da pastoral direta, de contato imediato com o povo. Pe Ângelo, homem de princípios sólidos e simples, de pão-pão, queijo-queijo, não entendeu bem esse meu pedido que contrariava todos seus projetos de ter um professor português ensinando Português no seu seminário e colégio (já tinha espalhado a notícia em Balsas e em S. Luís...), mas se esforçou para entender e não atrapalhar. Mas sei que não foi fácil, pois era um carácter forte e decidido. E habituado a mandar e a obedecer sem discussão. A relação dele com os mais novos, ordenados após o Concílio Vaticano II, não foi fácil, devido à profunda mudança na mentalidade, inclusive sobre vida religiosa e a pastoral, mas houve um bom esforço recíproco de respeito, mesmo nas naturais e legítimas diferenças.
Passou os últimos 20 anos da vida dele na região de S. Paulo. Desse período, eu não tenho notícias dele.
Em breves palavras, foi o que lembrei, agora, sobre o Pe. Ângelo de Lassalandra (adotou este sobrenome quando se naturalizou português!)
Meus colegas padres combonianos, alunos em Viseu na década de 50, também poderiam ser convidados a dar seu parecer. Se for preciso, posso dar o e-mail de alguns deles. E alguns colegas do tempo de Pe. Ângelo em Balsas, também.
Agosto de 2008.

Depoimento de Eunice Costa Carvalho Machado

Eunice Costa Carvalho Machado (Exerceu o cargo de secretária do Colégio São Pio X, em Balsas-MA,  por doze anos. Presidente da “Associação dos Amigos de Pe. Ângelo”.)
“Pe. Ângelo era uma pessoa de personalidade muito forte. Era radical em seus princípios. Não admitia falhas em quem trabalhava com ele. Não aceitava desculpas pelo não cumprimento do dever. Por outro lado, era um homem muito humilde, chegando a pedir desculpas, quando alguém lhe chamava a atenção por alguma insatisfação.
Era um autêntico sacerdote, tanto no exercício de seu ministério sacerdotal, como em tudo que fazia, como na função de professor, de diretor.
Era grande devoto da Mãe de Deus, a quem chamava carinhosamente de “Mãezinha do Céu”.
Certa vez, recebeu de sua família uma quantia em dinheiro para comprar um carro para ele. Com esse dinheiro, em vez de comprar o carro, construiu o Auditório do Colégio e Seminário [São Pio X], que, na época, era o que podemos chamar de “a menina de seus olhos”. Era completamente desprendido dos bens materiais.
Tinha extrema preocupação com a formação espiritual de todos, pois, como costumava repetir, “só tinha corpo saudável, quem tinha alma sadia”.
“Uma certa vez marcou reunião com os pais, ou responsáveis dos alunos, no prédio do antigo Cine Santo Antônio. Por um deslize de memória, esqueci-me do Livro de Atas. Ele fez-me ir, às pressas, a pé, ao Colégio, um tanto distante, para buscar tal livro, pois não poderia deixar de ser lida a Ata da reunião anterior.
Pe. Ângelo buscava a perfeição e procurava levar os outros a fazerem o mesmo.
Trabalhar com Pe. Ângelo ajudou-me muito a amadurecer e a adquirir cada vez mais responsabilidade e compromisso em todos os meus atos de vida.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Pe. Ângelo La Salandra – Uma Vida, Uma Missão. Balsas, 7/12/2001, pp. 44-45.

Depoimento de Stael Barbosa Coutinho

Stael Barbosa Coutinho
(Ex-aluna de Pe. Ângelo, no Colégio S. Pio X, em Balsas-MA, em 1969/70. Trabalha atualmente em empresa do Governo Federal, em Brasília-DF. Enviou-nos o seu testemunho por e-mail em agosto/2008)

“Pe. Ângelo foi nosso professor de Filosofia no primeiro e segundo anos do 2.º grau no Colégio São Pio X. Responsável pela direção do colégio nos deixou muitos ensinamentos. Sua devoção por NOSSA SENHORA e pela recitação do Rosário foi algo que me marcou para sempre.
No colégio, antes de entrarmos em sala de aula, posicionava-se no último degrau da escada e nós seus alunos ficávamos ao seu derredor para juntos rezarmos a AVE-MARIA. Seus passos apressados quando cruzávamos pelos corredores e, com seu olhar ao mesmo tempo afável e paternal, sempre a nos dizer:
“Meus filhinhos e minhas filhinhas”.
Hoje, tantos anos depois, conservo na minha memória muitas reminiscências daquele período. Recordo a sua intensa devoção a Maria; onde quer que estivesse estava sempre rezando. 
A sua simplicidade e pureza de coração, em sala de aula, ao reagir às brincadeiras de seus alunos, me levam a recordar uma das mais belas passagens do Evangelho -- O SERMÃO DA MONTANHA. A meu ver se aplica bem a sua pessoa aquele trecho em que Jesus ensina:
“[...] Felizes os que têm o coração puro, pois eles verão a Deus.” (Mateus cap. 5, vers. 7).”

Depoimento do Dr. Edmar Oliveira

Dr. Edmar Oliveira
(Ex-aluno e seminarista do Seminário e Colégio São Pio X, é hoje um médico conceituado em Balsas-MA. Deu à sua clínica o nome de Pe. Ângelo La Salandra. Nas eleições de 2008, foi eleito prefeito de Riachão-MA, sua cidade natal. Participa
do projeto “Resgate da Memória de Pe. Ângelo”.)
“Um homem sem ideal, sem sonhos, é como uma árvore desfolhada, morta. O vento passa e não lhe balança os galhos, sua sombra nada abriga, nem insetos; são apenas traços disformes que o sol projeta sobre a terra.”
“Se não me falha a memória, era o ano de 1981. Eu morava em Jundiaí, São Paulo, fazendo o quarto ano da Faculdade de Medicina.
Certo dia, senti uma necessidade grande de falar com o Pe. Ângelo. Senti dele uma enorme saudade. Queria olhá-lo, ver como estava, sentir aquele olhar brilhante que penetrava no mais profundo d’alma; aquele rosto redondo, aquelas bochechas que pareciam duas romãs mergulhadas naquela barba grisalha, longa, porém pouco espessa. Queria sentir aquela aura de santidade, falando com paixão de Jesus e da Virgem Maria.
Era um dia de semana, mas resolvi que iria faltar às aulas, pois nos finais de semana, eu trabalhava em São Paulo. Não podia adiar aquele encontro, não podia desperdiçar aquela vontade, aquela disposição, aquela oportunidade de recarregar minhas baterias. Eu andava meio pra baixo, um tanto desmotivado, angustiado. Sentia meu espírito em verdadeiro estado de inanição, parecia num turbilhão, sem ideal, distante de Deus.
Tomei um ônibus e fui até São Paulo. Lá tomei um coletivo que me levou à Casa Comboniana.
Identifiquei-me e fiquei aguardando na sala de espera, ansioso. Assim como o filho que há muito não vê o pai, a quem ama e admira.
Lá vem ele, descendo as escadas, passos apressados. Os mesmos óculos que tornavam mais expressivos o brilho de seus olhos; a mesma sandália que usava sempre; a mesma calça (ou o mesmo estilo) folgada e um pouco curta, acima dos tornozelos, deixando aparecer as meias; a mesma camisa azul clara,
parecendo de um tecidinho barato e, por baixo dela, a mesma camiseta branca de malha. Os dentes falhados, o mesmo sorriso puro como de uma criança, ou mesmo de um anjo, de um santo.
‘Oh! Salve! Meu Edmar, que satisfação! Jesus e a Virgem Maria estejam contigo. Oh, filhinho, que bom te ver!’
Eu, ainda sem acreditar que estava ali, beijei sua mão, como nos tempos de seminarista, no São Pio X, em que ele, reitor, andando em silêncio pelos corredores, a passos lentos, com o terço, ou o breviário na mão, todos lhe beijávamos a mão antes de dormir, como o filho que pede a bênção ao pai.
‘Padre Ângelo, eu é que estou feliz por reencontrá-lo. Estava com muita saudade.’
E, se dirigindo para uma sala reservada: ‘Vem, anda cá, filhinho, vamos conversar’.
Primeiro perguntou como andava minha vida espiritual, como estava com Jesuse com Maria, se estava vivo, se estava freqüentando a Santa Missa aos domingos. Com jeito de quem não estava falando a verdade, respondi que sim, que andava muito ocupado, mas ia à missa de vez em quando. Perguntou sobre a minha família, meu pai, minha mãe, e aquela minha irmã que tinha feito o curso do CAER.
‘Como se chamava mesmo? Ah! Nossa Dagmar! Como vai ela?’ Perguntou sobre ex-alunos, falando de suas características, sobre amigos.
Tinha uma memória fantástica para lembrar nomes e particularidades da vida das pessoas. Se eu ainda não me havia casado e, como respondi que não, aconselhou-me sobre que tipo de moça eu deveria namorar: pura, ligada à Igreja.
Relembrava Balsas -- a nossa Balsas, como ele gostava de chamar e de que falava com a emoção de quem fala  de sua terra natal. Falamos sobre família, um de seus assuntos prediletos, sociedade, educação, política, pobreza, violência etc., etc.
Por fim, perguntou dos meus projetos, do meu idealismo. Falou de seu trabalho desenvolvido nas favelas e nos presídios, dando conforto espiritual e convertendo almas que se tinham desgarrado da fé, tentando minimizar a miséria, a fome de crianças pobres e sofredoras, filhas de pais presos e favelados. Visitando doentes nos hospitais, transmitindo-lhes fé, coragem, esperança, ou ministrando o sacramento da unção dos enfermos. Tentando reconstruir famílias desmoronadas, casamentos em ruínas. Enfim, do trabalho de um eterno idealista, de um sonhador acordado, querendo fazer com que os pobres sofressem menos e fossem menos pobres. Sonhava em  tornar o mundo melhor.
Falei, então, dos meus ideais, dos meus sonhos, de me preparar para voltar à nossa região, de ser um instrumento de Jesus, ajudando a curar doentes e salvar vidas. E encerramos nossa conversa, o nosso encontro, emocionados. Ele me dizendo esta mensagem que ficou para sempre gravada na minha memória da qual jamais esquecerei no momento em que a fé e o idealismo queiram fraquejar:
‘Filhinho, recarreguei as minhas baterias. Estou vendo que a semente que plantei germinou. Que um de meus ex-filhos continua idealista e sonhador, não se perdeu nos meandros da vida. Isso me dá forças para continuar minha luta, minha missão; formar homens, formar cidadãos para a vida, para o mundo.’
Saí dali também com minhas baterias recarregadas, leve, como se estivesse flutuando, mas com os pés no chão e com a certeza de ter conhecido e convivido com um grande homem, um dos maiores do mundo, um sonhador, um idealista, um realizador, mas, sobretudo, com a certeza deter convivido com um santo -- Santo Ângelo La Salandra.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Pe. Ângelo La Salandra – Uma Vida, Uma Missão. Balsas, 7/12/2001, pp. 46-49.

Depoimento do Sr. Marcelo Gurgel

Sr. Marcelo Gurgel 
(Pe. Ângelo nos conta em seu diário sobre o Sr. Marcelo Gurgel, empresário de São Paulo, que o ajudou em muitas situações difíceis. Em uma delas, uma senhora carente estava desesperada por haver perdido o seu barraco em uma enchente. Pe. Ângelo pediu auxílio ao amigo que doou uma nova casa a essa senhora. O Sr. Marcelo e a Sra. Christina Gurgel participam do nosso projeto de “Resgate da Memória de Pe. Ângelo”.)
“Certa noite de inverno, encontrei pela rua Pe. Ângelo, fazendo visitas aos guardas-noturnos, trabalho esse de inegável e incomparável valor. Recordo que tinha ganho de presente de minha esposa um casaco importado muito aconchegante e resolvi dá-lo de presente ao padre. Este me pediu para que eu o levasse até uma construção de um edifício e, chegando lá, vi o padre dar o meu casaco para um servente de obras. [...] Convicto de que este homem só fez coisas boas neste mundo, não tenho nenhuma dúvida de sua presença ao lado de Jesus Cristo.”
Sr. Marcelo também nos diz:
“Foram diversas as missas que assisti aos sábados, no Hospital Iguatemi, celebradas pelo padre. Ele sempre, com sua frase positiva, dizia: coragem! Para mim era um grande prazer poder me confessar com ele. Era uma espécie de lavagem, de um grande aprendizado.”

Depoimento da Sra. Maria de Nazareth Soares de Camargo Meira de Castro

Sra. Maria de Nazareth Soares de Camargo Meira de Castro
(Exercia o cargo de Presidente do Instituto Dona Ana Rosa, em São Paulo, na época em que Pe. Ângelo deu aulas de Ética e Moral a alunos carentes durante três anos.)
“Embora tenhamos recebido com tristeza a notícia do falecimento de Pe. Ângelo, agradecemos sua carta narrando os últimos fatos da caminhada desse grande missionário.
Só tivemos o privilégio de conhecê-lo por um curto espaço de tempo (anos 96 a 98), mas foi o suficiente para admirarmos sua suavidade, simpatia e grande espiritualidade.O Instituto Dona Ana Rosa é uma entidade que acolhe gratuitamente 1.200 crianças e jovens carentes, aos quais oferecemos muito amor, formação moral e cristã e também escolar, segundo sua faixa etária.
Temos 370 crianças na creche, dos 3 meses aos 7 anos de idade; 530 crianças na faixa de 7 aos 15 anos e 300 jovens dos 15 aos 17 anos que freqüentam nossos diversos cursos profissionalizantes. Foram esses adolescentes que se tornaram alunos de Pe. Ângelo.
Sua chegada ao nosso Instituto foi interessante. Sabendo que a casa abrigava tantas crianças e jovens, ele apenas foi chegando e oferecendo seus préstimos de professor de Ética e Moral. Naquele momento, creio que ele nem sabia com certeza que éramos católicos.
Foi então que contamos a ele um pouco da nossa história. Somos a mais antiga entidade beneficente do Brasil e temos a característica de ser de total responsabilidade de uma só família.
Fundada por meu bisavô, em 1874, até hoje, 126 anos depois, ainda é mantida e dirigida pelos seus descendentes.
Embora não sejamos uma escola confessional, nossa família Souza Queiroz é católica e contamos com o apoio e direção espiritual do Bispo de nossa Diocese, D. Emílio Pignoli.
Pe. Ângelo logo nos conquistou  a todos por sua bondade e carinho.Confesso à senhora que, a princípio, ficamos um pouco preocupados, sem saber como aquele grupo de adolescentes, naquela idade de irreverência e contestação, aceitaria a figura venerável daquele ancião.
Pe. Ângelo nos surpreendeu: conquistou de imediato aqueles jovens irrequietos que espontaneamente passaram a freqüentar suas aulas, cuja freqüência nunca foi obrigatória. Estou convencida de que seu segredo era sua santidade.
Ao partir para São José do Rio Preto, deixou muitas saudades. As últimas cartas que trocamos foram comoventes. A dele, demonstrando humildade, pedindo-nos uma carta de apresentação. Como se fosse necessário! E nossa resposta que espero tenha lhe demonstrado nossa amizade e gratidão.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, pp.76-77.

Depoimento de Teresinha de Jesus M. Lima

Teresinha de Jesus M. Lima
(Professora e diretora do Campus da UEMA - Universidade Estadual do Maranhão.)
“Em suas aulas de Educação Física, normalmente ministradas no Auditório, ensinava-nos valores éticos, os quais ele chamava de boas maneiras, onde, tenho certeza de que cada um de nós que por lá passou, traz consigo importantes conceitos da sociedade, os quais permanecem firmes em nossas consciências que jamais o tempo haverá de apagar. Lembro-me de pequenos detalhes que o querido mestre nos ensinava, muito embora não dávamos as merecidas atenções na época, mas que deixaram, ao longo de todos esses anos, marcas profundas em nossas personalidades, como, por exemplo: peça licença ao passar entre duas pessoas; cumprimente sempre as pessoas com um sorriso; nunca esquecendo o bom dia, boa tarde, ou boa noite; não se deve bater a porta com muita força.
Quando nos ensinava, Pe. Ângelo nunca foi capaz de gritar, ou até mesmo de se aborrecer com qualquer um de nós. Havia sempre um lugar especial no seu gabinete reservado para o diálogo, o questionamento e o aconselhamento.
Certa ocasião eu pretendia viajar para a casa de meus pais, em São Raimundo das Mangabeiras, pois era época dos festejos do Padroeiro, e inventei a chamada mentira de doente para justificar minhas faltas.
Pe. Ângelo logo verificou que nada constava na minha caderneta, justificando minha falta por motivo de doença. Por isso fui chamada ao gabinete, onde fui repreendida pelo ato da mentira. Este fato deixou marcas profundas em minha personalidade, aprendendo a importância da qualidade da lealdade, o que me faz até hoje odiar mentira.
A passagem de Pe. Ângelo nessa região deixou-nos importante legado em nossa vida, principalmente porque tudo o que ele realizava era com muito amor a Deus e à sua querida Mãezinha do Céu.
Quem de seus ex-alunos não tem um ato de louvor por ele?
Eu só tenho que agradecer por tudo que me ensinou e, com certeza, levarei para meu túmulo as atitudes e valores pregados pelo Pe. Ângelo, os quais tento repassar aos meus filhos, aos meus alunos, pois na condição de educadora, minhas ações e atitudes sofrem influências diretas dos ensinamentos do querido mestre, o saudoso Pe. Ângelo.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, pp. 51-52.

Depoimento da Sra. Marly Mendes Ribeiro

Sra. Marly Mendes Ribeiro
(Sra. Marly, de Sucupira do Norte, Maranhão, ministra da Eucaristia, acompanhava Pe. Ângelo visitando e levando a Eucaristia aos doentes da região. Saíam às 8 horas da manhã e encerravam os trabalhos ao meio-dia com o terço. Em suas cartas ela nos testemunha que ele se sentia muito feliz em poder ajudar pessoas tão necessitadas e humildes.)
“Sucupira do Norte, Maranhão, 7 de fevereiro de 2005.
 [...]
Eu gostaria de saber como é que está a canonização de Pe. Ângelo, se a Igreja já afirmou a santidade de Pe. Ângelo. Eu acredito que a santidade do padre tenha sido afirmada. Quero lhe dizer que já recebi muitos milagres. Tudo que eu peço ao padre ele me dá a graça, daí ter a certeza da santidade dele.
[...] Eu sempre rezo para você e para a santidade do nosso padre.
Com carinho, meu forte abraço,
Marly Mendes Ribeiro”

Depoimento da Sra. Maria Alice Silva

Sra. Maria Alice Silva
(Mãe de dois alunos que estudaram no Colégio São Pio X, em Balsas-MA.)
“Recordando o tempo em que meus dois primeiros filhos estudaram no Colégio São Pio X, que tinha como Diretor o Pe. Ângelo, vieram-me à memória o cuidado, a dedicação e o carinho que ele tinha por seus alunos.
A importância que ele dava à entrega dos boletins era tamanha que havia uma reunião com os pais e nós (pai ou mãe) é que recebíamos o boletim.
Cada aluno tinha um número. E era através daquele número que ele falava sobre o seu aproveitamento no colégio, seu comportamento etc. Assim ele falava sobre cada um, mas só os pais ficavam sabendo da situação do filho.
Após ser explicada a caminhada de cada aluno, que ele conhecia muito bem, é que era feita a chamada pelo nome e entregue o boletim aos pais.
Eu admirava muito aquela maneira de falar sobre os alunos, pois não causava constrangimento a ninguém. Pe. Ângelo tinha o dom de educar, de dirigir, de evangelizar através da escola.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, pp. 45-46.

Depoimento do Dr. Aristides Mascari Ferraz

Dr. Aristides Mascari Ferraz
(Advogado, grande amigo de Pe. Ângelo. Fazia parte da equipe que auxiliava Pe. Ângelo em vários projetos na Pastoral Carcerária e da Saúde.)
“Quando Pe. Ângelo exercia seu ministério missionário comboniano aqui em São Paulo, sempre o auxiliei, comparecendo aos jornais de Bairros, aos Distritos Policiais, até levava as revistas para os detentos, inclusive levando remédios. O trabalho de Pe. Ângelo, para sua idade de quase 80 anos, é carga pesada. E ele não pára. Durante a noite, sai às ruas para ensinaros irmãozinhos nordestinos [...] e os desempregados.
In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, pp. 69-70.
Dr. Aristides nos envia cópia da carta endereçada ao Dr. Willian Woo, vereador da Câmara Municipal de São Paulo:
“S. Paulo, 5 de setembro de 2005
Exmo. Sr. Dr. Willian Woo
Digníssimo Vereador da Câmara Municipal de São Paulo
Viaduto Maria Paula, Capital
Assunto: Pedido de denominação de rua para o Pe. Ângelo La Salandra, na periferia da Capital. Biografia inclusa.
É a presente, para reivindicar junto à Vossa Excelência, na medida do possível, a denominação de uma rua para o querido e inesquecível Pe. Ângelo La Salandra, conforme biografia inclusa, o qual nos deixou grandes recordações de zelo, austeridade, incansável dedicação à missão apostólica, espiritualidade quase monástica, oração de asceta, atenção pelos pobres, encarcerados, negros e índios.
A denominação de uma rua para o nosso Padre Ângelo La Salandra, da ordem dos combonianos, dedicada aos trabalhos de amparo aos hansenianos na África e no Brasil, será sempre um motivo para que todos se lembrem daquele que não mediu esforços para a concretização da Paz social em São Paulo e no Brasil.
No aguardo de suas prezadas ordens, subscrevo-me avocando pleno sucesso em sua carreira política e administrativa.

Cordiais saudações,
Jeniffer Morgan

Depoimento da Sra. Diva

Sra. Diva
(Em São Paulo, a mãe da Sra. Diva esteve muitos anos doente, acamada. Pe. Ângelo fazia visitas quinzenais.)
Falar de Pe. Ângelo é sentir muita saudade pelo carinho e pela atenção que sempre soube dar.
Eu tive a minha mãe doente durante doze anos, sendo que nos últimos nove anos ficou na cama dependendo de tudo e esse missionário fazia visitas quinzenais com chuva e sol. Aqui ele se apresentava para dar uma palavra de ânimo, de carinho e muita força tanto para a doente como para mim que cuidava dela. Imagine que ele me agradecia pela atenção que eu tinha pela minha mãe. Só ele, uma pessoa simples, bondosa, que quando chegava trazia uma irradiação tão grande e deixava minha mãe com mais esperança e bem mais calma.
Neste mesmo  tempo da doença de minha mãe, meu irmão teve que ser operado de emergência de apendicite supurada. Passou muito mal e aí fui buscar o padre e o levei ao hospital para dar a sua bênção. Prontamente ele me atendeu e fez mais visitas a todos os doentes do andar e as pessoas queriam que ele fosse mais vezes ao hospital. Mas o hospital era longe e ele já andava muito aqui no bairro. Às vezes ele tinha condução de um senhor que pertencia a outra igreja.
Tive o privilégio de estar com ele no ano passado, quando ele veio para palestras. Fez sua missa e participou da festinha junto a seu povo. Os nordestinos e eu estávamos presentes, pois minha mãe já havia falecido e eu pude comparecer.
Ele estava tão contente! Me deu muito conforto pelo passamento de minha mãe e eu e meu irmão temos que agradecer sempre esta pessoa maravilhosa que foi o Pe. Ângelo. Muitas saudades.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, pp. 65.

Depoimento de Dr. José Ignácio Silva

Dr. José Ignácio Silva
(Dr. José Ignácio estudou em Viseu, Portugal. Enviou-nos o seu testemunho por carta quando lhe comunicamos o falecimento de Pe. Ângelo.)
“Rio de Janeiro, 13 de março de 2001.
Parece-me mais uma graça esta de receber em minha casa notícias do Pe. Ângelo de Lassalandra e o seu retrato de santo já em plena fruição do “Salário Eterno”. [...]
Conheci o saudoso Pe. Ângelo de Lassalandra em pleno vigor da sua mocidade e zelosa, vibrante e santa ambição de ser missionário, isto nos idos de 1948-49, quando se empenhou de corpo e alma para fundar o Seminário das Missões de Viseu, em Portugal.
Exerci o magistério primário naquele meu distrito (Viseu) durante 6 anos e em 1955 emigrei para o Brasil onde fiquei 26 anos sem voltar a Portugal.
[...] Espero poder adquirir oportunamente os livros que serão publicados sobre esse santo que tive a graça de conhecer. E pedir-lhe-ei intercessões: porque, pelo que ele prometia na mocidade e realizou na sua longa jornada terrena, há de fazer parte do coro celestial, entoando hosanas na Casa do Pai.
Bendigamos ao Senhor por ele, pela intercessão de Nossa Senhora.”

José Ignácio

Depoimento de Odilon Botelho Júnior

Odilon Botelho Júnior
(Ex-aluno de Pe. Ângelo no Colégio São Pio X, em Balsas-MA e coordenador dos encontros de ex-alunos e amigos de Pe. Ângelo em Brasília-DF.)
“Pe. Ângelo La Salandra foi um desses homens de natureza singular. Deixou sua pátria para doar-se ao mundo, mais especialmente ao Brasil. Educador, em Balsas, fazia de tudo pelos seus alunos e pelo São Pio X que, com todo empenho, o elevou à melhor instituição de ensino na região, conjugando trabalho e disciplina. A Ética era ensinada na prática para as arestas da intemperança dos adolescentes. Usava sempre provérbios para ilustrar. Transcrevo alguns que proferia com freqüência: “Uma pedra lançada ao mar eleva o nível de todo o oceano”. Nesse sentido, ele jogou muitas pedras ao mar, de modo que o oceano de bondade, da fraternidade e do amor elevou-se substancialmente.
“Na minha vida quero trabalhar bem e muito, de modo que, quando eu morrer, quero deixar o mundo melhor do que quando nasci.” Essa foi a tônica de toda a sua vida: trabalhar incessantemente a cada dia, a cada minuto, para deixar melhor o mundo.
Seu trabalho junto aos pobres, na periferia de São Paulo e de São José do Rio Preto era o de ajudar sempre a população excluída e marginalizada, como os presos, desempregados e prostitutas.
Em Brasília, como em São Paulo, promoveu encontros de ex-alunos e maranhenses em geral, que realizava com muita alegria e empenho, como um pastor a conferir suas ovelhas.
Teria muito a falar de Pe. Ângelo, mas o espaço é restrito. Não posso deixar de mencionar, porém as suas cartas-circulares que enviava a todos os amigos. Na última escreveu: “A morte é a coisa mais certa que acontece em nossa vida terrena. Por que não sabemos a hora de sua chegada? Para que cada um de nós esteja vigilante, sempre pronto para dar conta a Deus de nossa vida e receber o prêmio eterno”.
Com certeza, Pe. Ângelo já recebeu esse prêmio por intercessão de Maria Santíssima, a quem prestava tanta devoção.
É o meu testemunho, como amigo e discípulo, nessa hora inevitável da partida.
Dezembro de 2001.

 In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, pp. 92-93.
Odilon Botelho Júnior nos enviou este 2.o testemunho em 2007, por ocasião dos nossos encontros do projeto “Resgate da Memória de Pe. Ângelo”:
Pe. Ângelo de La Salandra
“Veio para o Brasil, passando por Portugal [...]. No Brasil, pela primeira  vez, trabalhou em Balsas, onde deixou marcas do seu empenho e dedicação.
Voltando ao Brasil, trabalhou entre os índios, no Maranhão. Foi a seguir para São Paulo, onde trabalhava com os excluídos, miseráveis de periferias e das ruas.
Era devoto de Nossa Senhora de Guadalupe, a dos índios das Américas.
Foi exatamente com o dinheiro da partilha dos bens deixados por sua mãe que construiu a gruta do São Pio X. Era severo ao dirigir-se aos alunos mais afoitos, “tua mãe é boa, teu pai é bom... tu, macaco!!!”
Prestava visitas pessoais, e à distância, orando pelos alunos e a outras pessoas que se encontravam doentes. Eu mesmo fui contemplado por suas preces presentes por duas vezes: em Balsas e em S. Paulo.
Professor de Religião e Moral e Cívica, mostra-se ortodoxo. Já em História, demonstrava grande ênfase greco-latina e sua cultura.
A disciplina e perseverança eram seu grande cajado. Através delas, ele fazia calar uma multidão de alunos reunidos a seus pés todos os dias para ouvir seus comentários e preces, sem barulho ou gracejos.
Morreu longe de tudo e  todos que, respectivamente, construiu e o admiravam.
Em determinadas épocas, principalmente no Natal e Páscoa, enviava carta-circulares para seus ex-alunos e amigos.
Em Balsas, nos fins de semana, pegava sua velha bicicleta e ia pregar a palavra de Jesus àqueles que tinham fome e sede de comida e fé.
Convidou-me para organizar vários eventos, reunindo ex-alunos e outras pessoas residentes em Brasília, não sei se por me reconhecer como um líder ou para me trazer de volta ao Rebanho.
Doente, foi a S. Paulo. Pretendia ser enterrado, todavia, em Balsas quando da sua morte. Terra onde realizou um grande trabalho reconhecido por todos e onde se sentia realizado, em casa.
Por estas e muitas outras histórias poderíamos fazer uma corrente de fé pedindo aos órgãos competentes da Igreja a beatificação de Pe. Ângelo La Salandra.
Brasília, 5 de agosto de 2007.”

Depoimento de Benvinda Rodrigues

Benvinda Rodrigues
(Aluna da primeira turma do CAER –
Centro de Assistência de Educação Rural, em Balsas-MA.)
“Fui aluna do CAER na primeira turma. Possuía pouquíssima instrução escolar, mas, mesmo assim, fui convidada por Pe. Ângelo para fazer o Curso que muito me ajudou até hoje.
Após a primeira etapa, incentivada pelo Padre, comecei a dar aula de catequese às crianças e aos jovens do Ferreira, onde eu morava, lá nos Gerais de Balsas, distante de Balsas 270 km.
 Terminei o Curso em 1964 e cheguei a ser  a primeira professora da primeira escola que foi fundada no Ferreira. Com as orientações do Pe. Ângelo, comecei uma horta comunitária que deu bons resultados. Com os alunos e moradores, plantamos e colhemos verduras e outros produtos, usando técnicas novas e melhorando nossa alimentação e nosso relacionamento.
Pontualidade, competência, princípios cristãos, dedicação eram qualidades indispensáveis, pois, como ele repetia sempre, a professora é o espelho da comunidade. Esta escola, que depois contou com outros professores leigos, todos frutos do CAER, foi muito importante para aquela região, pois trouxe mais união, mais saber, mais respeito e mais fé ao povo do Ferreira e das localidades vizinhas.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, pp. 37-38.

Depoimento de R. Helena C. Barbosa

R. Helena C. Barbosa
(Pe. Ângelo foi seu professor de Filosofia e Religião e incentivou-a a ser catequista na Paróquia de Balsas-MA.)
“Hoje sou uma pessoa altamente pontual, levando muito a sério o tenho que fazer. Nunca atraso em meus compromissos e, se por acaso, acontecer de não poder chegar no horário, prefiro cancelar, deixar de ir. Isso foi fruto, em grande parte, de um acompanhamento que recebi de Pe. Ângelo, quando fui catequista, muito por insistência dele, que era meu professor de Filosofia e Religião.
A catequese era aos domingos, às 14 horas, no Convento das Irmãs. Era costume, na época, as pessoas irem tomar banho no rio nesse horário. E eu, de vez em quando, trocava o catecismo pelo banho do rio.
Certa vez ele veio até minha casa e contaram onde eu estava – no rio. Foi ele, então, até bem próximo do porto (Militana), onde eu estava, e pediu que alguém me chamasse. Naquele tempo, havia o porto dos homens e o das mulheres. E o fato de um padre, de batina, ir até bem próximo ao porto das mulheres era um desafio. Fiquei envergonhada, e isso marcou-me, servindo de lição.
Agradeço ao Pe. Ângelo por ter contribuído para que hoje eu seja uma pessoa mais pontual e responsável.”

In Maria do Socorro Coelho Cabral. Op cit, p. 39.

Depoimento de Raimundo Ulisses Santos Bastos

Raimundo Ulisses Santos Bastos
(Ex-aluno de Pe. Ângelo no Colégio São Pio X, em Balsas-MA. Participava desde a fundação do Centro Paulistano-Maranhense, em São Paulo. Faz parte do grupo dos coordenadores do Projeto “Resgate da Memória de Pe. Ângelo”.)
Pe. Ângelo
Quando eu estudava no Ensino Fundamental (antigo ginásio) no Pio X, era um dos menores da turma (baixinho), e os colegas mais altos costumavam tirar um sarro (gozação), nunca mais esqueço que um dia o nosso mestre Pe. Ângelo estava passando e ouviu o que meus colegas estavam dizendo, e falou “o homem não se mede aos palmos ou centímetros, mas sim pelo seu caráter e seus atos, este eu conheço será um homem de verdade”, ... isso realmente elevou minha auto-estima e me ajudou a encarar os meus colegas mais altos.
Outra vez já em São Paulo, num dos nossos encontros do Centro Paulistano-Maranhense, estávamos falando sobre a política nacional, aliás dos nossos maus políticos que só roubavam, na época se falava muito no verbomalufar, então perguntamos a ele, se os políticos (governadores, deputados, prefeitos, vereadores, etc.) que deveriam dar-nos bons exemplos eram os piores, o que deveríamos fazer?
Ele comentou “que nós deveríamos fazer a nossa parte, cada um a sua, não interessava o que os outros faziam, coloque o seu tijolo na construção do Brasil (da nossa sociedade) e se esforce para deixá-lo melhor do que o encontrou”...  

Depoimento do Sr. Isidro Almeida

Sr. Isidro Almeida
(O Sr. Isidro Almeida conheceu Pe. Ângelo quando este saía pelas redondezas de Viseu, Portugal, à procura de vocações. Estudou no Seminário de Viseu. Atualmente mora em Gafanha de Nazaré, a 5 km de Aveiro. É a nossa ponte de ligação com Portugal. Pediu a vários amigos portugueses que pesquisassem sobre Pe. Ângelo em Canas de Santa Maria, Paço de Arcos e Viseu e, graças a ele e a esses amigos, como o Sr. José Luís Ferreira, já estamos recebendo vasta documentação. O nosso muito obrigada aos amigos portugueses.)

“O PRIMEIRO ENCONTRO COM O Pe. ANGELO LA SALANDRA
Corria o mês de Maio de 1955 e já todos nós, meninos com 11 anos, só pensávamos que estava próximo o fim daquele ciclo de 4 anos de escolaridade. Não que para mim esse período tivesse sido difícil ou constrangedor, mas porque, necessariamente, a etapa seguinte da vida seria um pouco mais dura: o trabalho no campo era o destino de todos nós, salvo raríssimas excepções. Naquele tempo, continuar os estudos era privilégio dos filhos de pais abastados, e, na minha aldeia, era coisa que não existia.
Era uma tarde normal de aulas, quando o professor, após os 15 minutos de recreio habituais, nos mandou sentar e informou que, a partir daquele momento, não haveria mais qualquer tipo de exercícios escolares e que prestássemos atenção à pessoa com quem iríamos passar o resto da tarde.
Nesse momento, entra pela porta principal uma figura que ficou gravada para sempre na minha mente: um padre na casa dos 30 anos, magro, com uma batina ligeiramente diferente da que usava o nosso pároco e, o que mais nos chamava a atenção, com uma barba semelhante à que estávamos habituados a ver nos reis e heróis da nossa História.
E começou de imediato a sua intervenção: A África era um continente em que Deus ainda era ainda um desconhecido para a maioria dos seus habitantes, que urgia o envio de mensageiros para anunciar o Evangelho a essas gentes e que ele fazia parte de um grupo de missionários com destino a essas paragens. Nós, na Europa, éramos uns privilegiados, por, há séculos, termos o dom da fé, mas que não nos podíamos esquecer dos nossos irmãos africanos, das crianças semelhantes a nós, apenas diferentes na pele.
Aquele seu jeito de elucidar e cativar as pessoas  funcionou em pleno. Após meia hora de conversa, já quase todos nós estávamos na disposição de abandonar tudo e todos e segui-lo para onde quer que fosse e quando ele perguntou quem dos alunos da 4.ª classe (a finalista) gostaria de ir para o Seminário das Missões estudar para, um dia, poder ir para África, todos éramos voluntários.
Por indicação do professor, fui chamado para ter uma conversa com o Pe. Angelo (sim, agora já sabia o seu nome). O meu ambiente familiar, as minhas perspectivas para o futuro, a minha dedicação a Deus foram o tema da conversa. E como eu me sentia bem a falar com ele.
Ficou então assente que voltaria a passar pela minha aldeia num dos meses próximos para uma conversa mais profunda com os meus pais.
No início de Agosto, num dia calor tórrido, andávamos a trabalhar numa quinta a cerca de 3 km da aldeia, quando avistámos dois vultos, que desciam o carreiro em nossa direcção. Não tive dúvidas que um deles era o P.e Angelo. Mas nunca poderia imaginar que, em pleno Verão, com aquele calor das 4 horas da tarde ele se aventurasse a uma caminhada daquelas, sobretudo vestido, como sempre, com a sua batina preta. O seu meio de transporte era a velha mota BSA, mas aqueles caminhos só mesmo para carro de bois. Recordo-me que o seu primeiro pedido foi um pouco de água. Ainda hoje admiro o sacrifício daquela viagem. Poderia esperar pelo nosso regresso à aldeia, poderia ter pedido a quem lhe foi indicar o caminho que desse o recado para regressarmos, poderia ter adiado o nosso encontro, mas preferiu ser um de nós, calcorrear aqueles caminhos, àquela hora, demonstrando o interesse que tinha nesse encontro. E tudo ficou, efectivamente, resolvido nesse dia.
Dois meses depois, eu estava no Seminário de Viseu. O P.e Angelo, entretanto, foi nomeado pároco em Paço de Arcos (arredores de Lisboa) e apenas tive a oportunidade de o rever numa visita colectiva a essa paróquia. Sei que mais tarde foi para o Brasil onde desenvolveu obra de vulto, mas, não fosse a D. Iracema Fantaguci contactar-me, todas estas recordações se iriam esfumando com o tempo.
Isidro Almeida (Portugal). Setembro de 2008.

Depoimento de Iracema Santos Fantaguci

Iracema Santos Fantaguci
(Ex-aluna de Pe. Ângelo no Colégio S. Pio X, em Balsas-MA, em 1968/69. Participava em São Paulo do Centro Paulistano-Maranhense Brasil Melhor. Era encarregada, junto com seu irmão Nathan Santos, de enviar as cartas-circulares aos amigos de Pe. Ângelo, no Brasil. Participa atualmente da pesquisa para a edição destesite, resultado dos encontros realizados em 2007 do projeto de “Resgate da Memória de Pe. Ângelo”.)
“O caminho que estamos percorrendo no resgate da memória de Pe. Ângelo nos faz mergulhar na sua história, acompanhar passo a passo a sua trajetória e nos dá a conhecer a vida do missionário que se fez amor por onde passou, que se fez doação e se multiplicou em tantos Ângelos como um anjo de bondade que a todos quer acolher e socorrer.
Nesse resgate da memória de Pe. Ângelo, algumas imagens são marcantes: A imagem do “anjo-mestre” -- durante toda a sua vida passou a seus alunos lições de Ética, de Moral cristã, coragem e Fé. Tratava os alunos como a filhos que precisam de um pai presente e acolhedor.
Escrevia cartas-circulares para ex-alunos e amigos espalhados pelo Brasil e por outras partes do mundo, como Portugal e Itália, contando de suas experiências como missionário, contava sobre os sofrimentos físicos causados pelas inúmeras doenças graves e como conseguia vencê-las pela Fé e oração.
Sua ligação com seus ex-alunos e amigos era muito forte e, por desejar tê-los sempre próximos, criou o Centro Paulistano-Maranhense. Tínhamos encontros bimestrais na Capela Santa Cruz, na sede dos combonianos de São Paulo.
Quando ali chegávamos o mestre já estava a postos com giz na mão e anotados na lousa temas polêmicos como aborto, eutanásia, pena de morte. Refletíamos sobre a situação sociopolítica brasileira, nos indagava o que podíamos fazer para tornar o Brasil um país melhor para todos. Nesses encontros, voltava a ser o mestre.
Muitos de seus ex-alunos e amigos espalhados pelo Brasil, Portugal e por outras partes do mundo estão, agora, engajados no projeto de resgatar a sua memória. Não esqueceram o mestre e amigo.
Foi um “anjo-mestre” também para os alunos do Instituto Ana Rosa, entidade que cuida de crianças carentes e dá cursos profissionalizantes para adolescentes pobres de São Paulo.
Nos hospitais de São Paulo, temos a imagem daquele ancião, de calça escura, camisa azul-clara, barba branca, rosto sorridente, chegando como o “anjo-consolador” para a visita aos doentes. Chegava às vezes tarde da noite, sou testemunha disso, porque várias vezes visitou a minha mãe em hospitais de São Paulo. Dava-lhe a unção dos enfermos e depois ia de leito em leito, orando e falando de Deus aos que o quisessem ouvir. Dava-lhes ânimo e coragem. Minha mãe, às vezes na UTI, em estado muito grave, sempre que recebia a unção, melhorava, e logo tinha alta.
Outra imagem muito marcante é a do “anjo-noturno” que fazia a ronda pelo bairro, levando amizade e carinho aos guardas-noturnos, inserindo-os na Igreja, batizando-os, crismando-os. Somos testemunhas disso porque muitos deles foram batizados nos nossos encontros e seus nomes logo eram adicionados à lista para envio de correspondência.
Temos a imagem bem mais forte agora de Pe. Ângelo como “anjo-dos-presidiários”. Levava Deus aos distritos policiais, aos presídios. Conseguia dar aos presos novas perspectivas de vida, amolecer o coração e curar as feridas da alma. A transformação foi tão grande que, percebendo a pobreza em que viviam muitos moradores de uma favela próxima à cadeia, tiveram a idéia de jejuar doando o seu café da manhã para ajudá-los a matar a fome.
Mas Pe. Ângelo não foi só um “anjo-urbano”, ele também enfrentou ambientes de conflito de terra, na zona fronteiriça do Maranhão com o Pará. Era o “anjo da Paz”, aquele que trazia como arma o Terço, a confiança na Virgem Maria. As 5 “balas” maiores e a 50 “balas” menores do Terço mudavam a vida de quem cruzasse o seu caminho.
Também sentiu em seu corpo físico a dor causada por doenças graves das quais se recuperava como por milagre e com mais força para a missão.
Foi o “anjo-ternura”, “anjo-sorriso”, “anjo-acolhimento”, sempre respondia às cartas de seus amigos que lhe confiavam suas preocupações e sofrimentos. Sou testemunha disso porque cuidava da lista de endereços e remetia as cartas-circulares para ele.
Pe. Ângelo foi um anjo para os moradores de várias favelas de São Paulo. Na Paróquia de Santa Madalena, conseguiu transformar uma comunidade que vivia refém de traficantes. Criou várias pastorais que deram auxílio aos moradores carentes.
“Anjo-Amor” pela missão comboniana. Seu Amor ultrapassou as fronteiras de sua terra natal, a Itália, extravasando em Portugal e se solidificando no Brasil. Seguia os passos de Dom Daniel Comboni.
Amava os Sagrados Corações de Jesus e de Maria e esse amor expandia o seu coração em favor dos mais necessitados: favelados, presidiários, doentes, guardas-noturnos, operários de construção, migrantes nordestinos, meninos de rua. Nesse caminho, não esquecia seus ex-alunos, amigos, seus confrades combonianos. Acolhia todas as pessoas que estavam carentes de Deus e de Fé. Gastou-se até o último suspiro por esse amor sem medidas.
Realizou na Capela Santa Cruz, em São Paulo, o seu último encontro com ex-alunos e amigos em outubro de 2000 e adentrou o Céu no dia 7-12-2000. A imagem que nos toca mais profundamente é a de um santo. Um santo humilde, amigo, acolhedor, mestre, enérgico, manso, sorridente, incansável, um anjo que saía pelas noites distribuindo alimentos e agasalhos para os pobres, andava pelos hospitais levando atenção e consolo, ia aos presídios levando a esperança. Um anjo que esquecia de suas próprias dores cuidando das dores dos mais excluídos da sociedade. Convivemos com um santo, disso não temos dúvida.
Nosso projeto é reavivar em todos a sua memória. Queremos criar uma corrente de fé e de orações pelo Brasil, por Portugal, pela África, pela Itália, e por todos os lugares, para que consigamos a graça de que a Igreja o beatifique.” Dezembro de 2008.